Serás sempre parte do Benfica. Parte de nós. Adeus Deusébio.

Serás sempre parte do Benfica. Parte de nós. Adeus Deusébio.
Serás sempre parte do Benfica. Parte de nós. Adeus Deusébio. Eusébio da Silva Ferreira (1942-2014)

domingo, 10 de abril de 2016

Alma

Mais uma vez, o Benfica voltou a fazer uma exibição algo pobre fora da sua casa. Mais uma vez, teve de enfrentar uma equipa quase a descer e que jogou em bloco muito baixo. Contudo, empurrado pela crença de 25000 adeptos em loucura e com um coração do tamanho do mundo, conseguiu vencer mais uma final. Já só faltam cinco.


O nosso mister Rui mostrou mais uma vez ao que vinha: poupanças foram quase inexistentes. Apenas houve uma troca em relação ao jogo de Munique: o Fejsa, jogador de cristal, saíu do onze, dando o seu lugar ao Samaris. Desde cedo se percebeu o que seria a partida: a Académica tinha o seu homem mais avançado atrás do meio-campo e o Benfica estava cheio de dificuldades para circular a bola. E para complicar a nossa tarefa, aos dezanove minutos, a Académica aproveitou um corte defeituoso do Eliseu para abrir o marcador. Aí, o jogo tornou-se de facto impossível. Os estudantes jogavam que era uma vergonha: só se via tipos de preto no chão de cinco em cinco minutos. Penso que este deve ter sido um dos jogos com menos tempo útil que já vi. Deste modo, eles foram quebrando o ritmo de jogo e só a partir da meia hora o Glorioso se encontrou. Começou a jogar mais depressa e com mais largura. Começou por falhar um golo de cabeça pelo Mitroglou mas, pouco depois, o mesmo grego viria a empatar a contenda: cruzamento largo do Pizzi na direita do ataque para o cabeceamento colocadíssimo de Mitroglou. O Estádio de Coimbra foi abaixo e o Benfica, galvanizado pelo golo, teve duas grandes chances para a reviravolta: primeiro, a concluir uma brilhante jogada, o Pizzi fintou o guarda-redes e tropeçou na bola; depois, o Jardel, sozinho, falhou por completo o alvo. Saímos para intervalo empatados, mas com esperanças num bom resultado.

Imagem roubada ao Ontem vi-te no Estádio da Luz
Ao contrário do que seria de esperar, o Enorme entrou muito pior para a segunda parte. Voltou a jogar mais lento e pelo meio como no início do jogo. A Académica começou a perder ainda mais tempo (será que tiveram de ir para o hospital no final do jogo?) e abdicou por completo de atacar. Mesmo sem jogar muito, continuámos a falhar golos: primeiro, na sequência de um livre do Nico, o guarda-redes fez uma brilhante defesa. Depois, aos sessenta e cinco minutos, repetiu a dose, desta vez a defender uma cabeceamento do Jonas. O tempo ia passando e o Vitória ia cometendo mais riscos. Tirou o Samaris para pôr o Talisca, tirou o Pizzi para colocar o Carcela e substituiu o Eliseu pelo Raul Jimenez. Assim, começámos a cruzar mais, a carregar mais até que, a cinco minutos do final, deu-se o momento mágico: o André Almeida cruzou para a área e o Jimenez recebeu maravilhosamente e encheu o pé com todo o nosso crer, raça e ambição para dar a reviravolta. O Cidade de Coimbra explodiu. Foi uma festa imensa e até final não mais se jogou pois o Benfica fez com que a Académica provasse do remédio que usou durante todo o jogo. Talvez gostem de ir perder tempo para a segunda.


Não vou destacar nenhum homem do jogo. No geral, estiveram todos uns furos abaixo do costume. Contudo, há que elogiar toda a equipa pela crença que teve, pelo crer imenso. Mais uma vez, suou tudo que havia para suar e acreditou até ao fim. Menção honrosa para o Renato, que foi de novo omnipresente e simbolizou a luta dos nossos jogadores.

Bem, já só faltam cinco (ou ainda faltam cinco). Por muito que venham pressões de fora, por muito que estas pequenas equipas se esfalfem contra nós, a alma deste grupo parece ser tão grande que ultrapassa todos os obstáculos. E rapazes, quarta é para carimbar o bilhete para as meias.

Académica 1-2 Benfica
Mitroglou 
Jimenez

sexta-feira, 11 de março de 2016

À Benfica

Sensacional. Não tenho muitas palavras para descrever o que me vem na cabeça nesta semana. Percebo que pela primeira vez começo a ver o que é aquele Benfica de que fala a geração anterior à minha: jogadores velhos e novos, um grupo de trabalho muito unido e que está em comunhão total com os seus adeptos. Um Benfica que é uma família, que luta até ao fim, que acredita fazendo-nos acreditar, que ultrapassa o facto de não ter três centrais, de ter muitos jogadores importantes lesionados durante grande parte da época. Há muitas coisas que poderia dizer sobre este jogo europeu e sobre o outro com os lagartos, mas a única frase que me vem à cabeça, a única que faz sentido para explicar tudo isto é: "Amo-te, meu Benfica".

Zenit-Benfica (Lusa)

Como já disse, o Benfica entrou em campo com apenas um central de origem: Iceman Lindelof. Ao seu lado alinhou Samaris e à frente da defesa Fejsa. De resto, não houve grandes surpresas: Ederson manteve-se na baliza, Semedo substituiu o André e o Pizzi continuou a jogar à direita. A primeira parte foi relativamente tranquila. Diria mesmo que foi o Benfica que esteve superior. Teve a primeira oportunidade do jogo num livre bem marcado pelo Jonas. O Zenit respondeu num perigoso remate cruzado do Dyzuba mas o Glorioso cedo respondeu com um remate perigosíssimo ao lado do poste do miúdo Renato. No final da primeira parte os russos voltaram a ameaçar mas uma saída atenta do Ederson evitou males maiores. Saímos assim para o intervalo tranquilos sem nunca ter passado por um sufoco e até perto de matar a eliminatória.


Na segunda parte o jogo mudou. Eles não tiveram assim tantas oportunidades mas começaram a pressionar muito mais. Por duas vezes apareceram sós frente ao Ederson mas falharam. O Benfica até teve uma boa oportunidade que o Jonas não aproveitou mas seriam mesmo os russos a marcar. A jogada começou numa falta clara do Zhirkov sobre o Semedo. Contudo, o árbitro não marcou (uma das muitas vezes em que não o fez) e aquele acabou por chegar à área isolado para cruzar para o golo de Hulk, que empatou a eliminatória. Quando tudo parecia jogar contra nós, os nossos heróis ergueram-se. Levantaram a cabeça, seguiram em frente determinados e podia jurar que à volta de cada um deles vi uma espécie de aura, uma Mística que parecia algo apagada há algum tempo. E há que fazer uma pausa para dizer o que houve naquele momento.

Houve Benfica.

É verdade, provou-se que o facto de ser Benfica mais uma vez pode resolver jogos. Logo após o golo, o Enorme foi para cima do Zenit. Ainda não havia passado cinco minutos do golo e já o Lindelof obrigava o Lodygin a uma grande defesa. É certo que o Zenit ameaçou numa jogada individual do Dyzuba, mas mais uma vez o Ederson resolveu a situação de maneira competentíssima. E foi assim que, a cinco minutos do fim, quando já o Zenit jogava para o prolongamento, que se deu o momento chave, o momento que matou a eliminatória. O Jimenez recebeu a bola a uns bons trinta e cinco metros da área, recebeu-a com o joelho, deixou-a bater no chão e, de maneira imprevisível, rematou de forma estrondosa. Poderia ter sido um golaço, mas o guarda-redes russo voou e fez uma defesa impressionante contra a barra. A bola ressaltou para a frente e apareceu a correr, vindo de trás, o capitão, o mestre Nico Gaítan a fazer o golo de cabeça. Festa total no relvado. Jogadores, Rui Vitória, todos a soltar um grito de revolta, um grito de festa, pois estava encontrado o vencedor da eliminatória. Porém, no Benfica joga-se sempre para ganhar e os jogadores sabiam disso. Assim, na última jogada, o Nico recuperou a bola deu no Talisca que tirou um da frente com um toque subtil e rematou rasteiro para o dois-a-um. Brilhante.

 Zenit-Benfica

Foi uma excelente exibição de toda a equipa que soube fazer das fraquezas forças para assegurar a passagem e ainda garantir a vitória. Contudo, há que destacar dois jogadores: o Fejsa e o Samaris. O primeiro fez um jogo estupendo (talvez a sua melhor exibição com o manto sagrado), estando em todo o lado a recuperar bolas. Um polvo. O segundo fez um jogo brilhante a central, um jogo de esforço, dedicação e sacrifício cumprido com mestria um papel que nunca é seu e acabando mesmo incluído na equipa da semana da Champions. Porém, não deixo de destacar ainda o Lindelof, o Renato ou o Gaítan, que fizeram sólidas exibições também.

Mais uma vez, o Benfica deu uma lição a todos. Uma lição de humildade, de força, de raça, à Benfica. Mostrou que é nas adversidades que o nosso clube voa alto como a águia que carrega o peito. Para mim, volta a ficar a sensação que cada um daqueles que luta por nós está feliz, que é cada vez mais parecido com um adepto e que deixaria tudo em campo pelo nosso lema, E Pluribus Unum. Tenho de pedir desculpa ao Rui, pois não acreditei nele. Dou a mão à palmatória: apesar de talvez não ser o melhor treinador, conseguiu unir esta equipa, transformá-la numa família em que cada um estaria disposto a dar a vida pelo outro, e no meio disto tudo ainda fazer dessa família um grupo vencedor. Apesar dos poucos recursos que lhe deram, soube aproveitá-los melhor que ninguém e, que se saiba, nem Renato, nem Ederson nem Lindelof tiveram de nascer três vezes. E isto tudo sem cérebro. Lá vai o nosso Ferrari a alta velocidade, a desaparecer no horizonte. E agora pés bem assentes no chão. Temos a primeira das nossas nove finais Segunda-feira e há que encará-la como encarámos os últimos dois jogos.

Termino apenas agradecendo: obrigado Rui, obrigado equipa, por terem despertado em nós aquela Mística, aquele Benfica Gigante, Enorme, Europeu, Vencedor, aquele Benfica de solidariedade, de luta, de família que já há muito não víamos.

Amo-te, meu Sport Lisboa e Benfica.

Zenit 1-2 Benfica
Nico
Talisca


sábado, 16 de janeiro de 2016

Jonas, ou como as coisas mais importantes da vida se podem encontrar num campo de futebol

A poesia é oferecida a cada pessoa só uma vez e o efeito da negação é irreversível, in "Contos Exemplares, de Sophia de Mello Breyner Andresen


Antes de mais, peço desculpa pela minha demorada ausência. Entre incidências várias, junta-se ainda a falta de coisas para contar. Esta temporada não tem sido particularmente entusiasmante em termos de futebol e isso retrai um pouco a actividade de escrever. Contudo, há pessoas pelas quais vale a pena ir dando uns toques na escrita.

Não há muito tempo folheava por acaso os "Contos Exemplares" de Sophia de Mello Breyner e deparei-me com a frase que dá o mote a este texto. É uma frase que pessoalmente me diz muito. Tal como dizia o professor Keating no "Clube dos Poetas Mortos", a Matemática, a Ciência, a Medicina, tudo isso é muito bonito, mas a Arte, a Literatura, a Poesia, o Amor... é por essas coisas que vivemos e morremos. Parece-me um bom ideal de vida e isso reflecte-se na minha visão do futebol.

Após a nossa vitória em Braga, em que Mitroglou jogou a titular, ouvi um conjunto de pessoas a dizer que o Jonas não podia ser titular do Benfica. Jonas não era, de acordo com esse certo conjunto de pessoas, o avançado ideal do maior clube do mundo, já que não era alto, forte, possante, etc. Marcava "alguns golos", mas não era bom jogar fora com ele em campo. Tempos mais tarde, quando jogámos em Setúbal e vencemos de novo, lembro-me que o Jonas, além de marcar, fez um passe brilhante para o nosso avançado grego marcar. E sorri. De alívio, porque fora golo do Benfica; mas também porque tive pena daquelas pessoas que achavam bem tirar o Jonas de campo.

Jonas não é só o melhor marcador do Benfica, não é só (ao momento em que se escreve) o Bota de Ouro Europeu, nem é apenas um jogador que tem uma excelente visão de jogo. Jonas é poesia em movimento. Ver Jonas jogar causa uma sensação que poucos jogadores causam em mim: dá-me prazer. Tenho vontade chorar só de pensar no privilégio que é ter Jonas em campo com o manto sagrado. Jonas é a "Desaparecida", de John Ford, é "O Sol dos Scorta", de Laurent Gaudé, Jonas é filho dos melhores escritores, dos melhores realizadores, dos melhores pintores. Jonas é a Arte. 

Jonas é aquele amor adolescente intensíssimo que queremos que nunca mais acabe, com o qual queremos passar o resto das nossas vidas. Querem uma melhor declaração de amor que uma recepção de Jonas? Querem um abraço mais caloroso que ver uma finta sua, um passe seu, ou tão somente ver a jogada em que ele pensou há vinte minutos materializar-se?

Tirar Jonas do onze seria tirar a poesia das nossas vidas, seria deixar morrer o Amor, seria destruir a Arte, seria vender a nossa alma ao Diabo e deitar à fogueira todas aquelas coisas pelas quais vale a pena viver e morrer.

Deus tenha todos aqueles que negaram Jonas, porque o efeito da negação da poesia é irreversível. Porque as pessoas não vão aos estádios para ver os brutos. Vão aos estádios para ver a Arte, para ver os Jonas desta vida, e enquanto eles existirem existirá também este desporto maravilhoso que a todos fascina: o futebol.

Obrigado, Jonas, por nos lembrares todos os dias que há coisas pelas quais vale a pena lutar. Por nos avisares que o mais belo da vida pode estar num campo de futebol.